27 junho 2010

O voto obrigatório

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O Instituto Datafolha realizou recentemente uma pesquisa nacional sobre o voto obrigatório no País. O resultado foi um rigoroso empate: 48% são favoráveis e 48% são contrários ao voto obrigatório. Os mais ricos e de maior escolaridade são os que mais defendem o voto facultativo, mas, em contrapartida, dizem que, mesmo sem a obrigatoriedade, iriam em maior número às urnas do que os mais pobres e menos escolarizados. Isso quer dizer que a população mais informada e com maior poder aquisitivo julga que o ato de votar deveria ser opcional e eles, livremente, compareceriam às urnas. Já os de menor renda e de escolaridade fundamental considerasm o voto obrigatório como mais adequado, mas não se mobilizam tanto para votar.
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O tema é complicado e controverso. Há argumentos fortes dos dois lados da questão. De um lado, pode-se dizer que, não sendo o voto obrigatório, compareceriam às urnas aqueles que fazem suas escolhas de maneira consciente e, assim, os resultados seriam melhores para a democracia. Do outro lado, há a opinião de que o voto não é um direito e sim um dever, e que há um aprendizado fundamental e evolutivo quando se obriga as pessoas a votar.
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Os números da pesquisa revelam um importante fato: se o voto fosse facultativo, provavelmente os mais pobres e de menor escolaridade iriam em menor número às urnas. Isso, é claro, introduziria um perigo viés nas eleições, favorecendo os candidatos de maior apelo e penetração nas camadas mais ricas e de maior instrução.
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Os defensores da liberdade individual certamente optam pela não obrigatoriedade do voto. Julgam que o Estado não deve interferir na sua esfera privada de opinião e decisão. Aqueles que consideram que há fortes compromissos e obrigações com a sociedade, e que a individualidade não pode sobrepor-se aos interesses de todos, provavelmente serão mais simpáticos ao voto obrigatório.
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Nesse confronto, os defensores do voto facultativo afirmam que ele levaria a maelhor qualidade no processo democrático, já que o sufrágio seria muito mais pensado e resolvido. Tenho cá minhas dúvidas. Apresento duas situações para ilustrar minha preocupação: a primeira diz respeito à compra de votos. Uma visão apressada diria que, com o voto facultativo, isso acabaria. No entanto, pode-se dizer que, votando menos gente, fica mais fácil - e mais barato - , comprar o voto, já que será necessário arrebanhar menos gente para votar e eleger determinado candidato.
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Outra, é um caso histórico: na França, onde o voto é facultativo, houve uma eleição à Presidência da República há alguns anos onde os dois candidatos mais fortes eram o presidente Jacques Chirac, que concorria à eleição, e Lionel Jospin, do Partido Socialista, pela oposição. A esquerda, tranquila e certa de um segundo turno onde tudo se decidiria de fato, , não foi votar. O resultado surpreendente foi que Jospin acabou suplantado pelo ultradireitista Jean Marie Le Pen, criando uma situação que claramente contrariava a opinião da maioria dos eleitores franceses.
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Na minha opinião, o voto brasileiro deve continuar a ser obrigatório. Ele permite que todos participem, e força as pessoas a buscar opiniões e preferências no processo, ainda que de forma incompleta e às vezes na última hora. Isso é melhor do que a indiferença e a omissão, tão presentes na nossa sociedade atual.
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["Tribuna Livre" - Alcindo Gonçalves: engenheiro, cientista político, professor do Programa de Mestrado em Direito da Unisantos e coordenador do IPAT]
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Fonte: Jornal "A Tribuna" de Santos - 26JUN2010, p.A-2.

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