14 outubro 2008

ATRASO ANUNCIADO

Angra 3 nem saiu do papel e já está atrasada - ainda bem! O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, bem que queria iniciar a construção da terceira usina nuclear brasileira em 1º de setembro, mas vai ter que esperar a liberação da licença de instalação do Ibama, que ainda não saiu. De acordo com o Ministro do Meio Ambiente Carlos Minc, falta cumprir 60 exigências para autorizar o início das obras. A mais polêmica delas é sobre a construção de um depósito definitivo para o lixo nuclear.

Minc não tem perdido oportunidades para esbravejar que a licença só sai se a Eletronuclear, empresa responsável pela construção e operação da usina, equacionar a questão do lixo radioativo. Diante do problema, o setor nuclear está jogando essa batata quente de um lado para o outro. A Eletronuclear é responsável pelo gerenciamento de resíduos de baixa radioatividade, já a CNEN, precisa solucionar os problemas do lixo de média e alta atividade.

“O setor nuclear e o Ministro Lobão sabem que é impossível cumprir essa condicionante porque em lugar nenhum do mundo existe solução definitiva para os resíduos radioativos. Resta saber se o MMA vai ceder à pressão”, disse Rebeca Lerer, coordenadora da campanha de energia do Greenpeace.

Mesmo as usinas nucleares consideradas mais modernas já são marcadas por atrasos e orçamentos estourados. Os reatores EPR (Reator Pressurizado Europeu), tidos pela indústria como ícones da renascença nuclear no mundo, já estão com o cronograma atrasado. As obras da usina Ulkiluoto 3, na Finlândia, estão atrasadas em dois anos e meio, e os custos já dobraram, atingindo € 5 bilhões. Na França, a construção do EPR foi interrompida pela autoridade de segurança nuclear francesa, após apenas seis meses de trabalho, devido a problemas crônicos de segurança e com isso também vai ficar pronta fora do prazo estipulado.

Além dos atrasos de cronograma, a energia nuclear também é atrasada como forma de geração de energia. “É lamentável que o governo Lula tenha optado por investimentos em energia nuclear em um país com a abundância de recursos renováveis como o Brasil. Temos todas as condições de criar pólos tecnológicos de fontes limpas como o sol, biomassa e vento e assumir a vanguarda mundial” afirma Rebeca Lerer. O governo se rendeu a uma visão do século passado, seduzido pelo poder perigoso da energia atômica. Nessa escolha quem perde mais é a sociedade, que hoje vai pagar os custos de construção de Angra 3 e que vai continuar arcando com os custos do gerenciamento dos rejeitos radioativos a perder de vista.

Para piorar, o governo insiste no erro e anuncia a construção de mais quatro usinas no Nordeste. Faz também planos para obter a auto-suficiência na produção de combustível nuclear para todos os novos reatores até 2014. Se isso acontecer, a mineração de urânio terá que ser ampliada, aumentando também os custos, riscos e impactos associados à geração de energia nuclear no Brasil. A mineração do urânio é a primeira etapa de uma série de impactos da energia nuclear, que só aumentam durante todo o ciclo de produção do combustível. O processo culmina com a produção de rejeitos radioativos que saem dos reatores nucleares. Quanto mais usinas forem construídas, mais lixo, insegurança e desprezo às leis ambientais teremos no país.

“O governo federal está atropelando a legislação ambiental brasileira, fruto de tanto debate e luta da sociedade. Ao impor ao Ibama e ao Ministério do meio Ambiente uma solução técnica para a decisão política de ressuscitar o programa nuclear brasileiro, o governo desconsidera os impactos ambientais e as alternativas disponíveis no país. O licenciamento ambiental acaba sendo o único canal de discussão da sociedade, mas que acontece sob o peso de uma decisão já tomada”, lamenta Rebeca.

Revista Greenpeace - jul/ago/set-2008, pp.16-17

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